por Hamilton Júnior*
Mas o pai disse aos servos: Trazei depressa a melhor roupa e vesti-o; ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés; trazei também o melhor bezerro e matai-o! Comamos e alegremo-nos, porque este meu filho estava morto e reviveu; havia se perdido e foi achado. E começaram a se alegrar. Lucas 15: 22-24
Afinal, somos filhos? Se formos, que tipo de filho temos sido?
Às vezes, vivendo sob certas circunstâncias, agimos sem pensar nas consequências e esse talvez seja o quadro vivido pelo filho mais novo da parábola do filho pródigo, pois quando chega diante de seu pai e lhe diz: "Dá-me a minha parte da herança, que vou ir viver a minha vida!". Isto deixa claro, em sua visão limitada, que acreditava que viver a vida a sua maneira seria melhor, que seria mais bem sucedido longe de seu pai.
Mas o texto diz que este menino, chamado pródigo, codinome esbanjador, perdeu todo o dinheiro dissolutamente, pois o texto grego usa a palavra Asotos (ασωτος) que se traduz por "desregradamente". O comentarista William Barclay afirma que a melhor tradução para este termo é "mal investido", ou seja, não saber aplicar os bens e perder tudo.
Mas no versículo quatorze, o texto nos informa que uma grande fome veio sobre a terra e que agora o menino deseja comer as vagens da Alfarrobeira, uma semente escura muito parecida com o gafanhoto silvestre, e que mesmo sendo ele agora tratador de porcos, um animal impuro para os judeus, se lembra da fartura da casa de seu pai e deseja ser um trabalhador em sua casa.
Talvez, essa seja mais uma explanação sucinta dessa parábola que você lê, mas sabemos que toda esta parábola é narrada para uma aplicação moral. Nosso Senhor está nesse momento usando toda cultura judaica para expor seu puro Evangelho, por isso primeiro devemos fazer algumas observações importantíssimas.
No início do capitulo quinze, Jesus esta sendo questionado por se sentar e comer com publicanos e pecadores. William Hendriksen, salienta em seu comentário de Lucas, que por pecadores podemos entender a escória da sociedade daquela época, homens endividados, viciados, nômades, perdidos, isto é, pessoas mal vistas pela sociedade arbitrária da época. Os publicamos, por sua vez, eram desprezados porque sendo judeus trabalhavam para Roma, portanto, eram tratados como traidores.
O simples ato de Jesus estar sentando com eles já descreve um elo de comunhão com a cultura judaica. Vendo esse quadro, os fariseus e escribas, começaram a questionar os que estavam fora da casa e certamente foi o que incomodou Jesus, fazendo-o contar algumas parábolas.
Primeiro, fala sobre uma ovelha que se perdeu do rebanho e da atitude do pastor em deixar as noventa e nove para buscar apenas a ela. Segundo, fala sobre a busca pela moeda perdida por uma mulher que Warren Wiersbe, em seu comentário, acredita ser uma espécie de dote ou preço que a filha recebe do pai no ato do casamento para que, caso ela enviuvasse, voltasse para a casa.
Isso representa a busca de Deus aos perdidos ao enviar seu Filho à humanidade. Porém, nesta terceira parábola, Jesus usa três personagens, um filho mais novo que sugere a morte de seu pai através do requerimento de sua herança, o pai que está diretamente ligado ao texto e um filho mais velho que surge no final.
O mais novo é descrito em um quadro geral de inconsequência, comete muitos erros destacados no texto, mas que se arrepende a tempo, os versículos dezoito e dezenove nos dá esta informação assim: “Pai pequei contra os céus e contra ti e não sou mais digno de ser chamado seu filho”, e ainda, “me de um lugar de trabalhador”, expressão que o texto grego descreve como uma espécie de trabalhador freelancer. Errou sim, mas agora reconhece seu erro e, ao pedir perdão, demonstra um total arrependimento.
O segundo filho do texto, o mais velho, está presente desde o principio do texto, mas nas entrelinhas. Quando o mais novo pede a herança ele participa diretamente do ato e, segundo a tradição judaica, ele ficaria com dois terços da herança enquanto o mais novo um terço, assim certamente ele foi beneficiado com o ato do mais novo. Mas, segundo a tradição, o irmão mais velho era quem deveria cuidar dos mais novos e se esse mais novo não tinha juízo é porque o ele não cumpriu com suas responsabilidades, além do que, na volta do mais moço ele não o recepciona e chega depois de a festa ter começado.
Portanto, o quadro que vemos é de um filho que comete muitos erros, mas os reconhece, e outro que sempre esteve do lado de seu pai, mas insistindo no erro, pois não honrava seu pai como deveria.
Mas a personagem ilustrativa principal dessa parábola, o pai, que segundo William Barclay deveria levar a epigrafe dessa passagem como o "pai amoroso", pois só o fato de dividir sua herança como os filhos e despedir com amargura um e permanecer com o outro amargurado em casa já fariam juízo ao termo. Mas além dessas coisas ele ainda corre o risco de envergonhar-se ao correr ao encontro do filho quando este retorna, pois segundo a tradição era vergonhoso para um homem de idade correr e o abraça sendo ele agora um andarilho sujo e mal cheiroso.
O que demonstra o amor incondicional deste pai é o que se segue a todo este cenário. O pai recobra, diante de todos, os direitos de filho ao pródigo colocando no seu dedo o anel com o brasão da família e o final do texto deixa isso claro quando diz: "meu filho estava morto e reviveu".
É assim que Jesus termina a parábola, ou seja, dizendo que o perdido foi achado. Realmente não precisava dizer mais nada, afinal estava comendo com pecadores e falando com filhos injustos.
Realmente o filho mais novo é o nosso retrato de pecadores que permanentemente viviam no erro, sujos e fétidos, mas um dia alcançados por Aquele que veio correndo ao nosso encontro de braços abertos para limpar nosso passado com seu sangue e colocar no nosso dedo o direito filial, nos fazendo gozar de um bem que não merecemos, isto é, a salvação. Afinal estamos sujos com o pecado e não merecemos receber algum direito, nem se quer de um trabalhador, quanto mais de sermos chamados de filhos servos de Deus.
Mas ele vem todos os dias ao nosso encontro, pega-nos em seus braços, limpa nossas roupas, nos dá um “beijo” e nos chama para vivermos em seu reino. Somos alvos de seu afago gracioso mesmo diante de nosso estado de miséria. O seu abraço paternal nos arranca todos os dias das garras do mal nos oferecendo seu aconchego de paz. Nunca mereceríamos seu perdão nem mesmo seu amor, mas mesmo assim ele insiste em nos amar em nos trazer em seus braços carinhosos.
E mesmo ele nos dando tudo isso, o que fazemos para retribuir? Se o Evangelho de Cristo nos manda proclamar o reino, o que estamos fazendo? Temos um Deus fiel mesmo diante de nossa tamanha infidelidade e não somos gratos na maioria das vezes!
Será que merecemos mesmo uma herança?
Ele nos pega em seus braços sujos maltrapidos cheirando mal e nos chama de filhos, e nós não sabemos nem agir como filhos.
Quando chamados, Apenas ao Evangelho, devemos recobrar nossa consciência e entendermos qual filho somos, ou seja, o que esteve sempre ao lado do pai sem ser filho realmente ou o pecador que assume sua culpa e estado de fraqueza para ser aceito pelo pai no seu reino e não mais permanecer no erro.
Que nossos atos provem um verdadeiro arrependimento e que o Senhor possa nos chamar de filhos.
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